sexta-feira, outubro 08, 2010

Sonho Americano

Economia é uma ciência temperamental. Sem pedir licença, ela invade nossos lares e remexe as nossas vidas das formas mais inusitadas. No Brasil temos assistido ao lado caridoso da Madame Economia. Nos últimos anos, muitos brasileiros pela primeira vez tiveram acesso à casa própria e ao carro zero. Nos Estados Unidos, por outro lado, Dona Economia tem andado de mau humor e chacoalhado até a estrutura da família americana. A recessão dos últimos dois anos, com a destruição de trilhões de dólares em riqueza e mais oito milhões de empregos, tem forçado americanos a cancelar a saída da casa dos pais e estudar perto de casa e postergar a troca do carro. Para azar das mocinhas do Tio Sam, os americanos casaram-se menos. Como todo mundo sabe, casar custa caro. Com menos emprego e crédito, muitas noivas estão sendo enroladas ou, na melhor das hipóteses, tendo de aceitar apenas juntar os trapos. Quem acha que casar custa caro, espere até chegarem os filhos. Temerosos, os americanos pisaram no freio também na procriação. O número de nascimentos despencou. Ampliar a família ficou para depois. Quer dizer que a crise e a recessão estão reduzindo o número e o tamanho das famílias americanas? Não necessariamente. Com a Economia, nada é tão simples. Há um fato na vida familiar que pode custar mais caro que o casório, lua de mel e filhos: a separação. O número de divórcios despencou por lá. Melhor aguentar a jararaca do que acabar quebrando, estão pensando os gringos. Muitos acreditam que esta recessão americana não passa de uma crise passageira, como tantas outras e que tudo logo volta ao normal. Se eles estiverem certos, estas tendências familiares serão revertidas. Infelizmente, eu não tenho a mesma fé. Durante três décadas, famílias, instituições financeiras e o governo americano se endividaram para sustentar um estilo de vida em que o consumo era muito superior à renda. Uma hora, chegaria o inverno e o momento das cigarras apertar os cintos, poupar, pagar dívidas e consumir menos. Desconfio que tal momento chegou. Tentativas do governo americano de aumentar os gastos públicos só conseguirão, na melhor das hipóteses, postergar o ajuste, roubando do futuro para tornar o presente menos duro. Se eu estiver correto, é possível que um período longo de desempenho econômico medíocre cause mudanças permanentes na estrutura familiar americana. Menos casamentos, menos filhos e relações desgastadas mantidas apenas por razões financeiras. Pobre sonho americano.

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