quinta-feira, fevereiro 17, 2011

As Flores

Certo dia, na Tunísia, um feirante é achacado por um policial, fato mais do que corriqueiro em dezenas de países. Indignado, o feirante coloca fogo em si mesmo. A autoimolação acende um rastilho que incendeia o mundo árabe. Começa a Revolução de Jasmim, alimentada pelo fogo do feirante e, também, pela indignação contra as precárias condições de vida, a corrupção e o desemprego na Tunísia. O exemplo tunisiano se espalha. Chega ao Egito e Mubarak acaba sendo derrubado. Lá recebe o nome de Revolução de Lótus. O movimento prossegue, abalando estruturas em outros países. Poucos meses atrás, qualquer prognóstico de que Ben Ali (Tunísia) e Mubarak (Egito) estariam fora do poder a curto prazo seria considerado fora de propósito. Amparados por uma postura pragmática em relação ao Ocidente, ambos os países eram considerados modelos de estabilidade e importantes para conter o radicalismo fundamentalista muçulmano. À parte as graves consequências para o mundo, o que se deu na Tunísia e no Egito serve de lição para analistas em geral. As probabilidades de que tais movimentos ocorressem eram próximas de zero. No entanto, aconteceram e o mundo não será o mesmo depois. Tunísia e Egito comprovam uma máxima da análise política: o inesperado sempre aparece. Ainda que os cenários apontem confortavelmente em uma direção, existe uma possibilidade – mesmo remota – de que o imponderável termine influindo decisivamente no destino dos eventos. Submetida ao fator humano, a política não deve ser reduzida a modelos analíticos que lidam pobremente com a incerteza. Após o ocorrido na Tunísia e no Egito, os cenários foram deslocados para uma zona de desconforto que ainda não está claramente delimitada. E, por mais que muitos saúdem tais eventos como fenômenos de democratização, nada garante que o resultado final amplie os direitos e as garantias dos indivíduos e o respeito à diversidade de gênero e de religião na região. Como disse Shakespeare, "em se tratando do ser humano, é melhor estar preparado para o pior".

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