segunda-feira, dezembro 04, 2006

Para entender a questão da dívida pública

Uma questão inicial é entender que, do mesmo jeito que o Brasil deve, ele tem a receber. Assim, o importante é tratar da dívida líquida, que é a diferença entre o que se deve e o que se tem a receber. Considerando então a dívida líquida externa, temos, então, uma boa notícia: o Brasil, hoje, é um credor líquido externo, ou seja, o que ele deve a outros países é inferior ao que tem a receber de outros países. E não é pouco, porque, segundo o Banco Central, isso chegou em outubro a 2,1% do PIB brasileiro – mais ou menos uns R$ 44,7 bilhões. Isso aconteceu porque o governo Lula resolveu acabar com a vulnerabilidade externa da dívida pública federal. Passou a quitar os compromissos que podia, em títulos públicos indexados ao dólar e também em relação aos empréstimos que o governo FHC tomou no Fundo Monetário Internacional. Desta maneira, podemos dizer que hoje o Brasil não deve, mas sim tem a receber, e está livre do FMI, como ressaltou várias vezes o presidente Lula. Por outro lado a grande questão não é o que deve o Brasil, mas o que o governo deve para os brasileiros, a dívida interna. Considerando o conceito de Dívida Líquida do Setor Público consolidado (União, Estados, municípios e estatais dos três níveis), cuja sigla é DLSP, o total é a soma da dívida interna, formada na maior parte pelos títulos públicos, com a dívida externa. A dívida líquida cresceu bastante no governo FHC – voltando ao patamar dos anos 80. Só que, diferente dos anos 80, quando tivemos a crise da dívida externa causada pelos choques do petróleo, no governo FHC o aumento foi causado pela elevação da dívida interna, seja pelo aumento da emissão de títulos, seja por conta dos juros reais daquele período. São vários os motivos que levaram ao crescimento da dívida líquida interna. Os tucanos costumam afirmar que é resultado da renegociação das dívidas dos Estados e municípios, quando a União assumiu vários compromissos deles, e também dos “esqueletos”, que eram aquelas dívidas que um dia o governo teve de reconhecer. Isto é e não é verdade. Boa parte do aumento da dívida interna foi causada pela falta de controle fiscal nos primeiros quatro anos do governo FHC e também pela âncora cambial praticada naquele período, fora os juros reais que mencionei. Os tucanos não gostam quando se fala nisso, mas no primeiro mandato de FHC, em vez de superávit primário, eles fizeram déficit primário. Além disso, só fizeram a Lei de Responsabilidade Fiscal porque o FMI colocou isso como condição em 1998, quando pediram empréstimos. E para manter o dólar baixo, o governo FHC emitiu títulos públicos a torto e a direito, pegando dinheiro no mercado e comprando dólares para segurar o câmbio. Na prática, só estavam aumentando o endividamento público, chegando ao absurdo de emitir títulos públicos para conseguir pagar os juros da dívida que haviam criado, num círculo vicioso. O gráfico acima resume, de maneira geral, a herança maldita que o governo Lula recebeu e que não terá solução em breve. O mais importante, no gráfico, é ver que no governo Lula caiu a dívida líquida total do setor público consolidado. Ela baixou de 55,5% do PIB, em dezembro de 2002, para 49,5% do PIB em outubro passado – o menor valor desde 2001, em especial por causa do esforço na liquidação da dívida externa, o que é muito bom, porque creio que todos e todas se lembram do que aconteceu em 2002, quando o dólar disparou e levou junto a dívida pública. Resolvida a questão da dívida externa, o Brasil e o governo Lula precisam encarar de frente a dívida interna. Os juros têm que cair para que caia também o serviço da dívida e assim o governo tenha mais recursos para investir no social, reduzindo a pobreza e melhorando a educação, a saúde, o trabalho e as condições de vida do povo.

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