quarta-feira, abril 04, 2012

Sampa

Percorrer a Avenida Sapobemba, cortando a zona leste da cidade de São Paulo, desde os limites da Mooca até São Rafael, é assistir a uma paulatina mudança de paisagem urbana: marcas famosas vão sumindo, construções perdem o acabamento, e os anos de uso dos carros em circulação se tornam proporcionais à quantidade de buracos no caminho. Enquanto rodam dígitos no hodômetro, terrenos baldios intercalam conjuntos habitacionais e casas cada vez mais modestas. O mato invade o espaço que seria das calçadas. A coincidência assume ares premonitórios. Entre a esquina com a Salim Farah Maluf e a encruzilhada com a estrada do Rio Claro, o conteúdo das urnas eletrônicas sofre um câmbio tão radical quanto à substituição do falar italianado pelo sotaque nordestino. São dois territórios com preferências partidárias arraigadas e muito diferentes entre si. Na eleição presidencial de 2010, José Serra teve 72% dos votos na Mooca. Mas a proporção mudava a cada quilômetro adiante, até Dilma Rousseff alcançar 65% da votação em São Mateus. O voto do paulistano está relacionado ao bairro onde ele mora. O PT tem seus maiores redutos na região periférica da cidade, enquanto o PSDB é forte no centro expandido. Esse padrão se repete desde os anos 90 em todas as votações. O determinismo geográfico do voto reflete uma divisão de classe. A explosão demográfica de São Paulo centrifugou imigrantes e trabalhadores de baixa renda entre os anos 40 e 80 do século passado. Em regra, quanto mais longe a moradia, mais pobre o morador. Quanto mais periferia, menos calçamento, iluminação e hospitais. O PT reforçou o geovoto durante os governos de Luiza Erundina e Marta Suplicy. Canalizou investimentos e programas assistenciais para as regiões mais pobres e distantes das zonas sul e leste da cidade. Cativou seu eleitorado em Parelheiros e Guianases, mas alienou eleitores dos bairros mais centrais que se sentiram preteridos com a mudança de prioridade. O PSDB é menos organizado que o PT, como provou o baixo quorum das prévias tucanas na cidade. Mas se faltam militantes, seu eleitorado é tão fiel quanto o petista. Em 2008, PT e PSDB lideraram, juntos, os votos de legenda para vereador em São Paulo: 21% para cada partido. A divisão se repetiu em 2010 na eleição para deputado federal. A legenda do PT recebeu 22%, e a do PSDB ficou com 19%. A concentração do eleitorado tucano é proporcional à riqueza dos moradores. No centro expandido, varia de 82% no Jardim Paulista a 68% no Butantã. Em décadas passadas, a outra parte do eleitorado antipetista foi malufista. É o segmento que se concentra numa faixa contínua, desde o Jaçanã e a Vila Maria, ao norte, até a Vila Prudente. Decepcionado e desamparado por seu líder, esse eleitor voltou-se para quem tem mais chances de derrotar os petistas. Votou em Serra em 2004 e em Kassab em 2008. Nesses pedaços da cidade, só muda a intensidade da vitória, mas o vencedor é sempre o mesmo: petistas na periferia e tucanos no centro e no colar malufista. Por isso, tornou-se estratégico o meio do caminho entre o petismo e o antipetismo. São as zonas eleitorais que oscilam de um partido a outro de eleição para eleição. É também uma zona de transição social, de emergência da nova classe média, que muda de hábitos de consumo e pode mudar também de partido. Na ZL, os termômetros que indicarão para qual lado a eleição vai virar são Ermelino Matarazzo, São Miguel Paulista, Vila Jacuí, Ponte Rasa, Vila Matilde, Itaquera, Conjunto José Bonifácio e Sapobemba. No Sul: Jardim São Luís, Socorro e Campo Limpo. Juntos, eles somam 1 milhão de votos válidos. O futuro prefeito de São Paulo deve sair do balanço dessas zonas.

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