sexta-feira, agosto 04, 2006

O câmbio não é tudo

Faz um tempo que a balança comercial vem, aparentemente, desafiando a idéia de que saldos avantajados não batem com câmbio valorizado. Em julho, a coisa foi ainda mais longe. Com a cotação do dólar abaixo de R$ 2,20, os números do comércio exterior bombaram. As explicações para o "fenômeno" são conhecidas. Os preços das commodities exportadas pelo Brasil continuam altos. Isso é verdade, mas pode estar chegando a hora de começar a observar os movimentos da balança com lentes multifocais. Para entender o que está acontecendo não basta fixar a vista nos preços internacionais e nem mesmo na trajetória da taxa de câmbio. Uma sugestão é olhar para a composição da pauta de exportação. Mas, cuidado: vista do alto, ela pode levar à conclusão de que o País vende hoje o que sempre vendeu. Mas há novidades. Petróleo e derivados, por exemplo. Até fins da década de 90, as exportações eram quase nada. Com o aumento gradativo da produção interna, as vendas ao exterior foram ganhando relevância e podem superar US$ 8,5 bilhões, neste ano. Já são os vice-campeões, atrás apenas dos veículos. Outra novidade que já chama a atenção na pauta de exportação são os telefones celulares. Para 2006, a previsão é de US$ 3 bilhões, o que significará algo perto de 2,5% das exportações. Há também itens, digamos, curiosos com peso crescente na pauta. Um deles é o conjunto de produtos incluídos em "consumo de bordo". Não parece, mas as receitas já somam US$ 2 bilhões por ano. Pouco menos do dobro do que entra com as vendas externas de suco de laranja, outrora um produto emblemático das exportações. No grosso, contudo, mudou menos a pauta do que o ambiente externo. Isso quer dizer que o câmbio está ajustado em torno de R$ 2,20 por dólar? Muitos responderão "sim", mas esta é uma resposta no mínimo arriscada. Quando se consegue deixar de lado o viés ideológico, dá para perceber que a balança comercial não é uma função apenas da taxa de câmbio, embora este seja um fator crítico ("a inflação aleija, mas o câmbio mata", dizia o ex-ministro Mário Henrique Simonsen). O sucesso também depende dos preços das commodities, da existência, a cada momento, de maiores ou menores barreiras protecionistas, dos arranjos produtivos das multinacionais e até mesmo da simples, mas poderosa, necessidade de sobrevivência.

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