quarta-feira, novembro 08, 2006

O PODER DAS PALAVRAS

Algumas palavras adquirem um tal poder no imaginário popular que contaminam o comportamento das pessoas. Temos no Brasil um exemplo paradigmático desse fenômeno. Nos idos dos anos 70, o mundo sofreu uma enorme especulação de preços, apoiada na cartelização dos produtores de petróleo. A demanda dessa commodity por unidade do PIB é um dado tecnológico que muda com o aumento da eficiência de seu uso. Para os países importadores, a melhor forma de enfrentar o problema da necessária redução do consumo seria permitir a incorporação aos preços internos do preço do combustível importado. O objetivo da política de preços deveria ser, portanto, estimular o consumidor a reduzir a utilização de petróleo. Praticamente todos os países altamente dependentes da importação do petróleo encontraram fórmulas que impediam, com algum sucesso, a contaminação do preço do petróleo sobre o custo de vida. Nosso ajuste durou dois meses, até que alguém inventasse a palavra expurgo para caracterizá-lo. Esta adquiriu, instantaneamente, uma conotação tão dramática e poderosa que intimidou o governo e se perdeu na sua justificativa moral para malefício da inflação e do equilíbrio externo. Essas considerações são para lembrar como boas idéias podem ser destruídas pela utilização de uma palavra que, de repente, incorpora o papel do "mal" no pensamento nacional. Outro exemplo: as "despesas correntes da União" têm crescido enormemente nos últimos 12 anos: avançaram 6,1% entre 1994 e 2002 e 5,8% entre 2002 e 2006, enquanto o PIB aumentou à míope taxa de 2,4% e a população, a 1,5% ao ano. O Brasil foi aprisionado numa armadilha que impede o seu crescimento. Sua carga tributária bruta é de 38% do PIB e sua dívida, da ordem de 49% do PIB. Mas é aqui que está a tragédia. O programa eleitoral cínico, dúbio e incompetente de um dos candidatos banalizou e retirou o impacto da expressão "choque de gestão". Transformou-o no instrumento do "mal". Foi rejeitado por dois terços da sociedade, que viu nele o codinome de "corte das despesas sociais". É hora de esquecer o nome para poder executar a idéia, sem cortar as despesas sociais.

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