segunda-feira, abril 11, 2011

Escassez e Potencial

Temos visto várias notícias sobre paralisações em obras do PAC em virtude de greves ou de ações de trabalhadores da construção civil.  Não se trata de movimentos estimulados ou coordenados por centrais sindicais. São manifestações espontâneas dos trabalhadores que reclamam das condições degradantes de trabalho e dos baixos salários. É impossível deixar de concordar com a maioria das reclamações dos trabalhadores deste setor, em particular nas grandes obras fora dos grandes centros. Há um enorme desrespeito por esta gente que durante muito tempo foi tratada com critérios que lembram um pouco os tratos dados aos escravos. Gente simples, que vem das regiões mais pobres do Norte e do Nordeste, sem educação e a procura de emprego, eles se deslocam milhares de quilômetros, para longe de suas famílias, para regiões inóspitas, sem estrutura nenhuma, sem lazer e com condições de alojamento, saúde, saneamento e lazer indignas em muitos casos. De acordo com Dieese mais de 170 mil trabalhadores do setor cruzaram os braços em Março, muitos em vários canteiros de obras do PAC. Não quero acusar as construtoras, o governo tampouco, nem culpar os sindicatos ou trabalhadores, porém tais  paralisações custam, pois há atrasos nas obras. E todos nós pagamos por isto. Quanto mais se adiam estes investimentos, mais devagar cresce nossa capacidade produtiva, o que reduz o ritmo de expansão da economia. Quanto mais se paga aos trabalhadores, quanto mais se gasta em provê-los de condições mais dignas de trabalho, mais caras ficam as obras, aumentando custo dos produtos e energia ali gerados. Mais caros ficam os imóveis. Mais inflação. Porém não há como dizer que tais reivindicações são injustas e que as empreiteiras não podem repassar tais custos aos contratantes de seu serviço, no caso, o Governo. Temos que aceitar isto. Contudo o que mais me intrigou nisto foi entender qual a razão destas manifestações neste momento. Temos um governo que apóia os trabalhadores, uma economia que cresce, sobram empregos no setor, não houve ação dos sindicatos. Então por que esta onda de greves agora? Bem, é muito simples: lei da oferta e da procura. No caso, oferta e procura de mão de obra. O desemprego no Brasil é de cerca de 6% da população ativa. No setor de construção é de apenas 3%. Em São Paulo tal desemprego é de 2%. O número de vagas disponíveis no setor cresce a mais de 15%aa. O rendimento médio de um trabalhador deste setor sobe a 11%aa, enquanto na indústria cresce a 1%aa. Com o boom imobiliário, projetos do PAC, Olimpíadas, Copa há uma demanda crescente por mão de obra deste setor. Tal mão de obra requer certa qualificação técnica em vários níveis. Pois é, esta gente hoje está em falta!  E como não temos escolas técnicas, a oferta de mão de obra fica muito restrita. Com pouca oferta e muita demanda, temos a combinação ideal para que os empregados adotem uma postura mais ativa e façam reivindicações justas por coisas que lhes foram negadas durante décadas por ter havido uma oferta abundante de mão de obra no setorUm desemprego de 3% neste setor indica que, na prática, não há gente disponível. Sempre há certo nível de desemprego residual em qualquer setor, pois pessoas estão mudando de empregos. Isto é muito comum neste setor, pois obras acabam e os trabalhadores ficam disponíveis até a próxima obra começar. Estes 3% são um nível de desemprego necessário e natural que deve representar este volume de mão de obra que fica temporariamente sem serviços entre uma obra e outra. Para se manter este ritmo acelerado de crescimento no setor vamos precisar de mais gente ou de mais produtividade. Logo, se o volume de trabalho continuar a subir no ritmo atual haverá um apagão da mão de obra para o setor. No curto prazo tal setor deve absorver mão de obra da indústria que sofre com a concorrência dos importados. Porém tal migração de mão de obra entre setores é complexa: as habilidades e aptidões dos indivíduos que estão na indústria são diferentes daquelas exigidas na construção civil. E não há uma política de treinamento de mão de obra no país que facilite esta migração. Uma alternativa é fazer como os americanos e permitir que trabalhadores de outros países da América Latina venham para cá e possam trabalhar na construção civil. Algo inédito não nossa história: importação de mão de obra. Enfim, os custos de mão de obra não vão cair tão cedo. E a capacidade de investirmos mais rápido era limitada pela falta de poupança para financiar os investimentos acaba de encontrar mais um obstáculo: falta de mão de obra. Esta limitação de mão de obra mostra que a taxa potencial de crescimento no setor deva ser bem mais baixa do que a taxa que temos experimentado. Quem diria: nossos peões de obra se tornaram um gargalo ao crescimento, como a falta de estradas, portos, aeroportos, poupança privada, escolas, etc. Ou aumentamos a produtividade no setor, com uso de novas técnicas e materiais,  para que possamos crescer mais sem usar tanta mão de obra, ou teremos sérios problemas de custos e de atrasos em obras.

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