quarta-feira, abril 06, 2011

Mitos levam a gastos equivocados

Como qualquer calouro de medicina aprende ao entrar na faculdade, para tratarmos uma doença, antes temos de diagnosticá-la corretamente. Tratando catapora como sarampo, as chances de sucesso caem bastante. Hoje, há um diagnóstico quase unânime de que o Brasil está passando por um processo de desindustrialização grave, causado pela valorização do real e seus efeitos nocivos sobre a competitividade nacional. Tanto o diagnóstico quanto sua suposta causa cambial estão equivocados. Nossa indústria vem batendo recordes. No ano passado, o crescimento da produção industrial, superior a 10%, foi o maior em 25 anos. O número de empregos criados no setor foi o mais elevado da história. Cresceu também o volume de investimentos. Nosso setor manufatureiro passou de oitavo a sexto maior do mundo, ultrapassando França e Reino Unido. Em 2000, nossa indústria era apenas a décima do mundo. Ficaram todos loucos, então? De jeito nenhum. Efeti­vamente, a participação dos produtos industrializados importados no mercado brasileiro está aumentando e nosso volume de exportações caindo. Hoje, excluindo-se veículos, ele é 25% menor do que há 3 anos. Além disso, o varejo cresceu mais do que a indústria. Entretanto, as razões dessa disparidade de desempenho são muito mais complexas e profundas do que a simples queda do dólarO volume de exportações brasileiras para os EUA, nosso principal destino externo para manufaturados, foi no ano passado 36% inferior ao período anterior à crise. Nossas exportações para Japão e Europa também ainda não retornaram aos patamares pré-crise. Reflexo de uma brutal contração de consumo por lá e forte expansão por aqui, levando nossa indústria e a deles a redirecionar produtos para o mercado brasileiro. Enquanto isso, nossas exportações para a China, o país que mais cresce no mundo e principal importador de nossas matérias-primas, aumentaram 77% desde a crise. Em resumo, menores exportações de industrializados para países ricos e maiores importações de lá não refletem nossa fragilidade, mas a delesComo a valorização da taxa de câmbio foi apontada como a causa das dificuldades da indústria, o governo vem adotando medidas para limitá-la. Uma delas vem sendo um colossal acúmulo de reservas internacionais, uma espécie de seguro contra crises, que nos últimos anos se multiplicaram por dez. Acontece que todo seguro tem um custo; no caso, a diferença entre a taxa de juros dos títulos brasileiros, cerca de 11% ao ano, e a taxa dos títulos americanos, próxima a 3%, multiplicada pelo tamanho das reservas, cerca de US$ 320 bilhões. Atualmente, a conta chega a mais de R$ 40 bilhões por anoNos últimos quatro anos, os investimentos públicos em infraestrutura cresceram mais de 50% em termos reais. Ainda assim, desde 2009, gastamos mais com a manutenção de nossas reservas do que com estradas, aeroportos, ferrovias e portos que tornariam o País mais competitivo. Além de investir mais, se gastasse menos com as reservas, o governo poderia reduzir impostos, estimulando nossa produção e consumoDiagnosticamos a doença errada e gastamos com o tratamento errado. Se estivesse na faculdade de medicina, nossa equipe econômica seria reprovada.

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