segunda-feira, maio 02, 2011

É uma Brasa

Nada é mais promíscuo do que o sexo grupal, exceto o Pensamento Grupal. A turma do mercado financeiro é muito propensa a esse pensamento grupal, isto é, "a tendência entre setores homogêneos a considerar os temas sob um mesmo paradigma e não desafiar certas premissas e interesses básicos". A opinião de cada indivíduo passa a ser um ato coletivo, mais ou menos orquestrado. Nas últimas semanas, tivemos um exemplo extraordinário de pensamento grupal. A forte reação do mercado à decisão do Banco Central de aumentar em apenas 0,25 ponto percentual a taxa básica de juro. Se bem percebi, foi uma unanimidade. O aumento foi considerado insuficiente para o controle da inflação, indício de fraqueza do BC e até mesmo da sua suposta subordinação ao desenvolvimentismo que domina a Fazenda. Quem ouve esse coro de especialistas e não tem acesso a certas informações básicas pode ficar completamente desorientado. Na realidade, entre os BC´s, o do Brasil está entre os que reagiram mais rapidamente ao risco de aquecimento. Desde abril de 2010, a Selic passou de 8,75% para 12%. A Cruzeiro do Sul publica um ranking mensal das taxas de juro reais em 40 países. O Brasil lidera esse ranking por margem cada vez maior. A taxa básica de juro real no Brasil alcança 6%. O segundo e o terceiro colocados, Turquia e Austrália, ficaram bem para trás, com aproximadamente 2%. A taxa média para os 40 países é negativa. Dos 40, nada menos que 36 países apresentam juros básicos reais negativos. O diferencial de juros nominais entre o Brasil e as principais economias desenvolvidas é imenso. Nenhum dos BRICS segue o padrão brasileiro de política de juros. A China e a Índia, que também estão enfrentando problemas de aquecimento e inflação, mais graves que os nossos, têm sido mais cautelosos em matéria de juros. O pensamento grupal no Brasil não toma conhecimento de nada disso. Não se leva na conta que um aumento ainda maior dos juros sobrecarregaria o déficit público. E pior: acentuaria a tendência à valorização do real, um dos mais graves problemas da economia do país. É evidente que a inflação preocupa. Há indícios de que a pressão está aumentando, em parte por causa de choques exógenos, em parte por excesso de demanda. Houve aceleração dos preços de serviços, que tendem a refletir no ritmo da demanda doméstica. As medidas de tendência da inflação também acusam aumentos recentes. Mas isso não significa que a resposta deva ser carregar a mão nos juros. Parece mais apropriado, nas circunstâncias atuais, combinar a política de juros com ajuste fiscal, medidas de controle do crédito e restrições à entrada de capitais e à tomada de empréstimos externos. Esse último tipo de medida mata dois coelhos: contém a expansão do crédito alimentada pela onda de capitais externos e contribui para atenuar a valorização do real.

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