O professor Archon Fung acredita que a América Latina pode estar passando por profundas transformações que significariam a reinvenção da democracia. Seu texto é uma análise de livros que tratam da democracia na região. Na verdade, apenas um trata da América Latina. Os outros três tratam do Brasil. O mais importante em seu livro é considerar que o Brasil estaria no epicentro da revitalização democrática e da criatividade institucional!!!
Tal afirmativa é forte, em se tratando de um país que ainda assiste a tantos escândalos e ainda apresenta traços arcaicos no modo de conduzir a política. No entanto, por mais otimista que possa ser, a afirmação não é desprovida de fundamento. Muitos estão ocupados em encontrar defeitos no sistema político nacional. Eu mesmo já escrevi sobre isso. É fácil. Difícil é encontrar bons exemplos que representem avanços concretos na direção do fortalecimento da democracia.
Um dos aspectos saudados como inovador por Fung é o Orçamento Participativo (OP), criação do PT gaúcho que institucionalizou o debate sobre as prioridades orçamentárias dos municípios. O OP foi implementado em 1989 por Olívio Dutra, foi mantido durante os 16 anos em que o PT governou Porto Alegre e foi seguido pelas gestões de Fogaça (PMDB) e Fortunatti (PDT). Devido à sua longevidade, essa iniciativa de participação popular ganhou projeção internacional. Mesmo com todo esse prestígio, o OP foi muito questionado em PoA. Como os prefeitos petistas não tinham maioria na Câmara, o OP também foi utilizado como uma forma de conquistar apoio popular, sobretudo nos bairros mais carentes. Por conta disso, a oposição classificava o OP como uma medida que buscava enfraquecer a democracia representativa. Outra crítica era que as comunidades beneficiadas eram aquelas cujos líderes comunitários tinham ligação com o PT. Independentemente dessas avaliações, o fato é que o OP foi uma medida exitosa de democracia direta.
Outra iniciativa que deve ser saudada como parte do arsenal de medidas não eleitoreiras e que fortalecem a democracia é a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES). Composto por 90 cidadãos representativos de vários setores, o CDES funciona como uma espécie de conselho consultivo para a Presidência acerca dos mais variados assuntos que impactam a sociedade. Em pouco menos de dez anos de existência, o CDES foi capaz de propor soluções e ações que se materializaram tanto como políticas de governo quanto como leis aprovadas no Congresso. Revelou-se interessante, ainda, para os Estados.
Considerando nossas fragilidades institucionais, estamos longe de representar um modelo para a reinvenção da democracia. Os avanços são lentos e muitas vezes tolhidos de seus aspectos mais inovadores. Porém, algumas das novas iniciativas se revelam bastante interessantes para institucionalizar uma participação mais efetiva da sociedade civil na governança do país.